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Havia peste a bordo




Havia peste a bordo. No primeiro porto onde atracámos fugi como pude. Sem olhar para trás. Dormia onde calhava acoitado nas sombras das arcadas, açoitado por delírios. O meu pulso rápido transportava hemorragias e na minha náusea de tudo troquei pedras preciosas por marfim, especiarias por pérolas e versos mutantes por mulheres com rostos que eram de um homem se esfaquear para cortar o desesperado fio do encanto.

E assim me fui levando.


Quando os calafrios chegaram, enganei-os com ópio e sexo sem amor, amor sem sexo e tudo o mais que é incompleto mas afinal completo da massa desmedida e efémera do que é mortal e belo, em suma, da fascinante merda que é existir. Gritava no leito tomado pelo tumulto deste mercado livre entre o céu e o inferno.


Nunca mais me curei dessa febre, dessa doença. Nem de todas as outras. Roçava-me contra escamas, raspava-me na cal mais viva da evasão.

E assim me fui levando.


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Vídeo e texto: Paulo Veríssimo - paulovero@gmail.com>

Percussões: David Menezes



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